12 août 2007

Timor Leste: a queda da “máscara” Xanana-Horta

O País
(Semanário Independente)
10.08.07
(Júlio Mendes)

Fui um dos que participou e se entusiasmou sem meias-medidas com a independência daquele país irmão asiático. Era o fim de anos de sofrimento de um povo humilde, perpetrado por países ambiciosos que demonstraram ao longo do tempo uma gritante desorientação na sua política externa. Era a vitória de uma causa que Moçambique acompanhou desde o princípio, através de loobies junto das Nações Unidas e em outros fóruns, no apoio directo aos membros seniores da Fretilin, e nao só.

Quando em 1998 vivemos aquela alegria, a imagem que se tentou transportar para o mundo externo era de que aqueles lideres que sempre lutaram pela independência estavam comprometidos com a causa do povo maubere, e eram os mais indicados para dirigir, com seriedade e comprometimento, o país. Estávamos convictos de que o objectivo comum era a restauração do país. Mas, tal como muitos, enganei-me redondamente. Volvidos poucos anos, o país nao andou. Muito do que transpirou para fora relaciona-se com os conflitos interpessoais dos destacados líderes.

E hoje após aquela palhaçada do ano passado, quando o sistema previamente montado tentou denegrir impiedosamente Mari Alkatiri, imputando-lhe várias culpas que culminaram com constantes manifestações e ondas de desordem por todo o país, sendo a mais grave a de alegadamente ter participado na distribuição de armas aos insurgentes, obrigando-o assim a ceder o cargo de primeiro-ministro, uma posição conquistada democraticamente, eis que a máscara começa a cair em Timor-Leste, com o anúncio do convite formulado por Horta a Xanana para que este último seja primeiro-ministro.

Segundo o pensamento crítico de alguns analistas não comprometidos com o sistema indo-australiano, que parece estar a instrumentalizar alguns políticos timorenses, Xanana Gusmão nunca foi um santinho pelo poder como sempre pretendeu se fazer passar. O mesmo pode-se dizer de Ramos Horta, que após o Prémio Nobel da Paz, partilhado com o grande Madiba, se tentou fazer passar por um democrata puro. No entanto, o derrube estratégico de Mari Alkatiri e o golpe político nas últimas eleições daquele país estão a demonstrar que estamos em presença de dois senhores bastante ambiciosos e com uma agenda que ultrapassa as fronteiras do pequeno espaço timorense.

Numa altura em que a questão de petróleo deveria ocupar os grandes debates daquele país, pelas possibilidades que o “ouro negro” abre para o desenvolvimento e para a erradicação da pobreza, eis que os políticos perdem mais tempo em conflitos pessoais, muitos dos quais consequentes das diferenças de opinião em relação à estratégia a adoptar na política externa, com a amizade com a Austrália à cabeça.

No dia 30 de Junho passado realizaram-se eleições legislativas, nas quais a Fretilin venceu, sem maioria absoluta, com 29.02 % dos votos. Como primeira consequência, Aniceto Guterres, candidato da Fretilin para a presidência da Assembleia Nacional Timorense, perdeu o cargo para Fernando “La Sama” de Araújo, líder do Partido Democrático. Em face dos resultados, e para atingir os seus objectivos, os quatro partidos derrotados nas eleições uniram-se para fazer frente à Fretilin. Até aqui nada a questionar, pois faz parte da estratégia política coligar-se. O que não se compreende muito bem é o papel que a dupla Xanana e Horta tenta desempenhar, quando à partida seriam os mediadores da boa convivência, unidade entre os timorenses, bem como pela responsabilidade e carisma que ambos ostentam. Mas como tinha acontecido aquando da queda de Alkatiri, os dois assumiram-se claramente anti-Fretilin, mas desta feita com objectivos claros, pela forma como instrumentalizaram o processo eleitoral e fizeram desacreditar a Fretilin junto das populações e parte da comunidade internacional.

A partir dai as coisas começaram a ficar difíceis para Mari Alkatiri e companhia. E com o desfecho das eleições, a estratégia de Ramos Horta e Xanana começou a ter pernas. E para que não restassem dúvidas, eis que na última semana chegam notícias segundo as quais Horta convidou Xanana para primeiro-ministro, uma proposta que nunca até então chegou a ser equacionada com muita propriedade. No entanto, para muitos, estava mais do que claro que Xanana nunca se adaptou à posição de presidente, dado que o regime político daquele país confere mais protagonismo e poderes ao primeiro-ministro. Agora, numa clara estratégia em que a igreja católica não está totalmente isenta, Xanana pode a qualquer momento ser confirmado primeiro-ministro, para fazer aquilo que sempre pretendeu. Mesmo que este não ocupe lugar, será alguém da sua inteira confiança e disponível para cumprir as suas ordens, o que não pode acontecer com Alkatiri, que até agora se mostrou íntegro e fiel às suas convicções. Aí é que o mundo vai poder saber, de concreto, a agenda com que a dupla Horta-Xanana se guia.

Por outro lado, com o cenário actual, fica mais evidente que Alkatiri nunca esteve envolvido com a desordem havida ano passado naquele país, pois tudo não passou de uma montagem para o desacreditar como líder político. Em parte foi conseguido, pois o eleitorado ficou bastante dividido, acabando por vencer por forma tímida e “cinzenta” as eleições, muito embora a Fretilin continue a demonstrar força no seio das comunidades.

Com os cenários menos agradáveis que se colocam no país, quem fica a sofrer é o povo, aquele que seria o ponto número um da agenda dos políticos. As ameaças de todas as agremiações políticas, de bloquear o desempenho da Assembleia caso nao fiquem satisfeitos com o desfecho que pretendem, podem ter um impacto que pretendem, mas o grande perdedor é o próprio país, que perde tempo em discutir pessoas ao invés de projectos concretos de combate a pobreza.
.............

Aucun commentaire: