11 août 2007

Timor-Leste: Que Estado para Timor?

Portugal Diário – 2007/08/09 - 16:13
Luísa Melo

A democracia não coloca no poder quem perdeu as eleições. E depois há outra vez violência nas ruas. E se não está nas ruas está latente. Este jovem Estado de Timor, a ser um Estado, é um Estado de Sítio.

Um mês e meio em Timor-Leste não deu para perceber quase nada de um país que continua à procura, ele próprio, de se perceber. É certo que foi em 2001, quando todas as esperanças eram válidas, quando acreditar era o caminho desejado e nem queríamos ouvir alguns alertas nem algumas atitudes que não conseguíamos entender, mas explicávamos tão-somente que se tratava de uma cultura diferente.

Sim, de facto, há coisas muito diferentes. E se os relatos de sobrevivência, de luta, de morte, de como se ultrapassa a morte de muitos filhos crianças, bebés até, me impressionaram e me marcaram, outros factos também se colaram na memória, no (des)entendimento: que as catanas, por exemplo, não servem só para apanhar fruta e que se usam por dá cá aquela palha, transformando a vida numa coisa com muito pouco valor; que as mulheres são as primeiras a acordar e as primeiras a deitarem-se e são elas, novas e velhas, que, vergadas pelo peso, quase com a cabeça a tocar nos joelhos, transportam todas as cargas possíveis sob o olhar vigilante dos maridos.

Podia falar de muitas outras coisas sobre as mulheres timorenses, podia falar até de uma alta autoridade timorense que, incomodado com as perguntas de uma jornalista, lhe respondeu que ela devia estar em casa a lavar a louça... Sim, podia falar muita coisa, mas seria sempre um olhar ocidental sobre um país do outro lado do mundo, ainda que tenha sido português, ainda que falem português (alguns), ainda que estejam lá muitos portugueses.

Quem está de fora tem, muitas vezes, dificuldades em conter as lágrimas ao ouvir o que viveram, ao perceber como vivem, mas quem lida com tudo na pele até se esquece do que isso é. Choram as mulheres. Que conseguem sempre encontrá-las no fundo da alma. Choram porque não vislumbram solução para um Timor de paz. Se, no início de 2001, já depois do referendo e com a chegada dos primeiros militares portugueses ao território, se queriam esquecer as lágrimas e o olhar vago as substituía, em 2007, elas voltam a saltar. Há esperança? Ou melhor, há esperança para além das orações católicas e fervorosas?

Xanana Gusmão personificava essa esperança, essa união do povo, a força de vontade de ultrapassar a ocupação indonésia e, uma vez auto-determinados, avançarem para o bem-estar e para a felicidade dos timorenses.

Mas isso de ser feliz, lá como cá, tem muito que se lhe diga. E a pessoa que antes era um símbolo de união é hoje um factor de divisão. De ex-Presidente da República passou a primeiro-ministro.

Talvez o que sempre desejou. Mas não ganhou as eleições. A maioria dos timorenses queria outro primeiro-ministro. Não é assim a democracia. A democracia não coloca no poder quem perdeu as eleições.

E depois a violência. Outra vez a violência nas ruas. E se não está nas ruas está latente. Este jovem Estado de Timor, a ser um Estado, é um Estado de Sítio.

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